
O livro O Povo Contra a Democracia: Por que a nossa liberdade está em risco e como salvá-la (The People vs. Democracy: Why Our Freedom Is in Danger and How to Save It), de Yascha Mounk, é um exame detalhado da crise da democracia liberal no século XXI. Mounk, um cientista político e historiador, argumenta que o modelo que combinou direitos individuais (liberalismo) e poder popular (democracia) está se desintegrando.
A Tese Central: A Desconexão entre Liberalismo e Democracia
A principal tese de Mounk é que, por muito tempo, a maioria dos países ocidentais viveu um casamento feliz entre democracia e liberalismo.
- Liberalismo: Focado em proteger os direitos individuais, como a liberdade de expressão, de religião, de imprensa e a independência do judiciário. É a limitação do poder do Estado e da maioria.
- Democracia: Focada na soberania popular e na vontade da maioria, expressa por meio de eleições e representação política. É o poder do povo.
A tese do livro é que, hoje, essas duas partes estão se separando. A democracia liberal está sendo atacada por dois lados:
- Democracia não liberal (Populismo): Neste cenário, líderes populistas eleitos pelo voto popular usam a “vontade do povo” como justificativa para minar as instituições liberais, como a imprensa livre e o judiciário independente. O poder da maioria é usado para silenciar e oprimir minorias e oponentes políticos. Exemplos incluem a ascensão de líderes como Viktor Orbán na Hungria e Recep Tayyip Erdoğan na Turquia.
- Liberalismo não democrático (Oligarquia ou Tecnocracia): Aqui, as instituições liberais e os direitos individuais são mantidos, mas a soberania popular é enfraquecida. Decisões importantes são tomadas por especialistas não eleitos (tecnocratas), bancos centrais e órgãos internacionais, longe do escrutínio público. O povo sente que não tem mais controle sobre suas próprias vidas, o que gera frustração e alimenta o populismo.
As Causas da Desintegração
Mounk identifica três fatores principais que contribuíram para essa desintegração:
- Estagnação econômica: Desde a década de 1970, a maioria das pessoas nas democracias ocidentais experimentou um crescimento econômico lento ou estagnado, levando a um sentimento de frustração e de que o “sonho” de uma vida melhor não está mais acessível. A desigualdade cresceu, e as pessoas culpam o sistema e as elites.
- A revolução da mídia social: A internet e as redes sociais mudaram a forma como a informação é consumida. Elas enfraqueceram o papel dos veículos de imprensa tradicionais como “porteiros” da informação, permitindo que a desinformação, as teorias da conspiração e o discurso de ódio se espalhassem de forma rápida e descontrolada.
- O multiculturalismo sem precedentes: A imigração em larga escala e a crescente diversidade racial e étnica de muitos países geraram um “pânico identitário”. Mounk argumenta que as sociedades democráticas têm a obrigação de acomodar e proteger os direitos das minorias, mas muitos cidadãos se sentem ameaçados por essas mudanças, o que é explorado por líderes populistas.
Como Salvar a Democracia Liberal
Apesar da análise pessimista, Mounk oferece um caminho para resgatar a democracia. Ele argumenta que não basta apenas defender as instituições ou a “vontade do povo”; é necessário reconstruir o equilíbrio entre os dois. Algumas das propostas do autor incluem:
- Combater a desigualdade econômica: Implementar políticas que ajudem a restaurar a prosperidade para a classe média e os mais pobres, como aprimorar a educação e investir em infraestrutura.
- Reformar a mídia: Criar leis para lidar com a desinformação nas redes sociais sem censurar a liberdade de expressão e fortalecer o jornalismo de qualidade.
- Reafirmar a identidade cívica: Encontrar um novo equilíbrio entre a proteção das minorias e a necessidade de uma identidade nacional compartilhada, com valores cívicos que unam todos os cidadãos, independentemente de sua origem.
Mounk conclui que o futuro da democracia liberal depende da capacidade de seus defensores de reconhecer seus fracassos e de oferecer uma visão convincente e inclusiva de uma sociedade próspera, livre e justa. A tarefa é reconstruir a confiança nas instituições e restaurar o senso de que a democracia pode realmente servir ao povo.
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