por Alexandre Gama [presidente e diretor geral de criação da Neogama/BBH]
Essa coisa de “crise de criatividade na publicidade brasileira” e de “necessidade de resgatar o brilho perdido” é uma falácia. É conversa de argentino e de brasileiro com baixa auto-estima. Não mudou muita coisa nos últimos anos em termos criativos para o Brasil.
A performance brasileira em filmes nos festivais internacionais, por exemplo, não está fraca porque nunca foi especialmente forte. Nos últimos sete anos em Cannes, tivemos apenas dois Leões de Ouro em Films, um deles da Neogama/BBH, em 2003, e outro da JWT, em 2005. Éramos mais fortes e fizemos nossa reputação internacional em cima da mídia impressa, essa é a verdade. E há que ser seletivo também. Nós, por exemplo, nunca participamos de festivais como Fiap ou Ojo de Iberoamerica, simplesmente porque não acreditamos na qualidade deles como organização, isenção e referência qualitativa de criatividade. Você tem que saber que régua escolhe para se medir.
Então, não existe essa coisa de “crise” da criatividade brasileira. Existe um novo ciclo que está sendo aberto com o aumento da importância das outras disciplinas da comunicação no mundo, além da propaganda. Esse novo ciclo pede uma reformulação do perfil do criativo brasileiro que trabalhava de uma maneira e agora tem que aprender a trabalhar de outra. Já faz alguns anos que tenho essa opinião e que imponho a mim mesmo e aos profissionais da minha área criativa uma mudança de perfil. Sempre fui um profissional que acreditou na força do conceito e do posicionamento, e fiz do planejamento minha base de trabalho. Fiz minha carreira e minha agência assim. Quando me associei a BBH o fiz fundamentalmente por causa da capacidade de planejamento criativa única no mundo que eles têm e com a qual me identifico como filosofia de trabalho. Trabalhamos assim já faz 4 anos e os resultados criativos já são cases. Aliás, essa é a nossa crença: case é mais importante que prêmio porque premia a agência inteira e o cliente. Os profissionais desse novo ciclo, portanto, não têm saída: terão que ser tão estrategistas quanto criativos. É claro que essa é uma capacidade que não estará em todos. Mas os que a tiverem liderarão o negócio e pautarão o novo perfil criativo. O Brasil vai bem obrigado.
Inclusive, acredito que o momento atual da economia nacional contribui para uma maior participação do país no desenvolvimento de campanhas globais. Fizemos isso com OMO, Surf, Johnnie Walker e inúmeros projetos internacionais para os quais fomos acionados em um grande pool criativo. Recebemos inclusive remuneração da BBH por projeto em que a Neogama/BBH se envolve. Mas acho que temos que parar de achar que só tendo reconhecimento internacional somos importantes. Existe essa coisa enraizada na alma brasileira que trazemos do Brasil colônia que nos faz precisar ser notados e valorizados pelos estrangeiros para nos sentirmos importantes. O Brasil hoje tem um mercado interno forte, em crescimento. A relevância do nosso mercado local nos impõe agora que olhemos também para dentro, nós que sempre buscamos historicamente o olhar para fora. Nesse sentido, nossa importância como gerador de conteúdo especifico para a realidade brasileira vai aumentar. Mesmo as empresas multinacionais que estão estabelecidas aqui sabem que tem que se voltar para o consumidor brasileiro de uma forma local e não global. E que se for global, que as equipes brasileiras façam parte do processo criativo internacional que vai gerar a campanha que será veiculada no mundo. Foi assim como OMO, por exemplo, quando conquistamos a conta.
Aqui na Neogama/BBH tenho forçado os criativos a encontrarem seus limites e aí expandi-los. Mas nossa metodologia de trabalho ajuda porque é muito própria e baseada na procura por idéias-primas, algo que só nossa rede tem. Há criativos que não se adaptam a pensar e trabalhar dentro desse jeito e naturalmente não são profissionais que se dariam bem na Neogama/BBH. Mas essa seleção natural é boa. Não queremos mesmo profissionais que sejam genéricos da área criativa, que tanto podem estar hoje aqui como em outra agência, fazendo as coisas do mesmo jeito. Nós estamos criando uma nova maneira de trabalhar comunicação e queremos mentes capazes de entender o que isso quer dizer. Nosso jeito de trabalhar é realmente o de um ovelha negra. É diferente, próprio, e focado no novo ciclo criativo.
Com relação aos clientes a resposta não é uniforme. A maioria não está preparada para entender e valorizar o esforço das agências e as mudanças empreendidas. Para ser honesto, a maioria ainda está presa a um modelo de operação que sequer permite que uma agência possa ser generalista, já que esbarraria na atribuição de uma agência especialista. Há uma minoria que já entende e pratica essa nova visão, mas são poucos felizardos que estão à frente.
Para mim, a proposição básica e mais importante do IV Congresso Brasileiro de Publicidade deve a preservação do nosso modelo de negócio, que se mostrou o melhor do mundo em termos de garantir vitalidade empresarial e qualidade ao serviço. Um modelo que permite atrair e pagar mão de obra de alta qualidade, manter o interesse na formação de profissionais nas faculdades de comunicação e dá às agências a chance de trabalhar de maneira plena e eficiente diante desse novo ciclo multidisciplinar da comunicação.
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